Por Adelson Vidal Alves
É de Mark Lilla, historiador americano, a frase “Embora nem todos os amantes sejam filósofos, os filósofos são os únicos verdadeiros amantes, pois só eles entendem o que o amor busca cegamente”. O filósofo é muitas vezes visto como um ser estranho, com perguntas sem sentido sobre tudo da vida.
Como pode um cara desses se entregar ao mais irracional dos sentimentos humanos, ou seja, o amor? O amor deveria ser monopólio dos poetas, somente estes são capazes de abandonar as diretrizes da razão para se entregarem a metafisicas novelescas. Mas não é bem assim.
O pensador alemão Martin Heidegger se envolveu com outro grande nome da filosofia: Hannah Arendt. A relação amorosa dos dois até hoje é objeto de polêmica, com críticas sérias a Heidegger, que colaborou com o nazismo. Mas o autor de “Ser e Tempo” foi capaz de demonstrar talento para o cortejo amoroso. Em carta a Arendt, escreveu: “Querida Hannah (…) Debaixo da tempestade a caminho de casa você estava ainda mais bela e grandiosa. E eu teria gostado de caminhar com você por noites sem fim”.
Simone de Beavouir, escritora constantemente citada pelas feministas, expressou com profundidade seu amor pelo cineasta Claude Lanzzman, 18 anos mais jovem que ela: “Minha querida criança, você é meu primeiro amor verdadeiro, aquele que acontece uma vez ou talvez nunca (…) Eu pensava que nunca diria as palavras que agora surgem naturalmente para mim quando vejo você – eu te adoro. Eu te adoro de todo meu corpo e alma. Você é meu destino, minha eternidade, minha vida”.
A autora de “O segundo sexo” não economizou versos melosos para demonstrar o quanto estava apaixonada. E o que dizer de Marx, o barbudo revolucionário que influenciou os subversivos mais duros e frios da história? Ele também se curvou ao amor. Em carta a Jenny, mãe de seus filhos, o filósofo alemão declarou: “Amadinha do meu coração, torno a te escrever porque estou sozinho e porque me cansa ficar dialogando contigo na minha cabeça o tempo todo (…) Beijo-te dos pés à cabeça, caio de joelhos diante de ti e gemo: Amo-a minha senhora”.
O homem que pretendia destruir o capitalismo não resistiu às garras da paixão, assim como Rosa Luxemburgo, a grande revolucionária alemã, que tratava o amado com adjetivos que damos a crianças, aquele jeitinho belo e ridículo como todos os amantes se tratam. Nada, porém, foi mais radical e incrivelmente lindo do que o sacrifício de amor do filósofo francês André Gorz, que cometeu suicídio junto com sua esposa Dorine, que sofria de uma doença degenerativa.
Temendo viver sem sua razão de viver, acordaram em partirem juntos. Em carta a amada, Gorz escreveu: “Você está para fazer 82 anos. Encolheu seis centímetros, não pesa mais do que 45 quilos e se mantém bela, graciosa e desejável. Já faz 58 anos que vivemos juntos, e eu te amo mais do que nunca. De novo, carrego no fundo do meu peito um vazio devorador que somente o calor do seu corpo contra o meu é capaz de preencher”. Declarações como esta podem ser encontradas no livro “Carta a D. – História de Um Amor”, publicado em 2006.
* Adelson Vidal Alves é historiador