Por Adelson Vidal Alves

Do carro de som ecoa a frase: “Não acreditem nas pesquisas da Folha de São Paulo, Bolsonaro é líder”. A fala lunática -, que tenta desqualificar os institutos de pesquisa que apontam decadência na popularidade do presidente da República -, faz parte de um repertório negacionista que vai da negação do vírus até as questões climáticas.

A narrativa insana e pitoresca é a estrutura fundamental do bolsonarismo, que prefere ignorar o Brasil machucado pelo desemprego, a inflação e as mortes pela pandemia, para se apegar ao “Mito” e suas loucuras. O acontecido foi registrado em Volta Redonda, na manifestação que repetia os atos em todo país, onde se pediu intervenção militar, destituição da suprema corte e outras pautas antidemocráticas.

A nossa Cidade do Aço, berço da industrialização nacional e palco de várias mobilizações civis por melhores condições de vida e trabalho, se converte temporariamente, e em parte, num lugar de culto à
boçalidade e ao autoritarismo. As dezenas ou centenas de pessoas que foram à Vila Santa Cecília prestar culto ao reacionarismo bolsonarista, deram uma espécie de cambalhota histórica.

A cidade que viu uma greve de trabalhadores ganhar dramaticamente importância histórica, agora precisa engolir cenas patéticas de desrespeito à institucionalidade constituída da democracia brasileira. Como chegamos até esse ponto?

O percurso de nossa história atual teve uma significativa ruptura no polêmico episódio da privatização da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Não trato aqui da inevitável desestatização da empresa, anacrônica o suficiente para perder competitividade. Falo do modelo que transformou a estatal em empresa privada, onde aspectos de território, cultura e direitos foram duramente afetados.

O município, que girava em torno da siderúrgica e que via nela o núcleo empregatício e de renda, muda completamente seu perfil sociocultural e econômico, rumo a uma realidade onde o mundo do trabalho se desloca para o setor de serviços. A memória operária de luta se converte em pragmatismo negociador de entidades sindicais. Os espaços de formação profissional e recreação se transferem para o ambiente privado, dificultando a mobilidade social que nascia da formação técnica de jovens pobres.

A política também é afetada pela mudança que Volta Redonda passa. Para quem foi governada por uma liderança popular ligada ao mundo sindical, como Juarez Antunes, a transferência para o “Netismo”
mostra um certo apego da nova geração a soluções messiânicas e populistas. A cultura netista encarna patrimonialismo, autoritarismo e clientelismo, com o aparelhamento dos organismos de funcionamento
democrático.

Durante a era Neto, que se renova agora, o que prevalece é o aparelhamento da imprensa, dos partidos políticos, dos movimentos de associação de moradores, e também de lideranças e intelectuais. Essa cultura política se internaliza na cidade a ponto de criar o ambiente propício para a chegada do bolsonarismo.

A classe média empobrecida e ressentida encontra na esquerda e no “fantasma do comunismo” o alvo para onde deve se dirigir seu ódio. O enfraquecimento dos organismos democráticos, a baixa qualidade parlamentar, o esvaziamento do debate público e a vitória do conservadorismo religioso no âmbito das
igrejas, ajeitam o espírito público para acolher com alegria o reacionarismo bolsonarista.

O espetáculo bisonho apresentado neste triste 7 de setembro na Vila Santa Cecília não é um ponto fora da curva. É o reflexo de uma guinada conservadora sem verniz democrático que nossa cidade vem passando. Bolsonarismo e Netismo se encontram na consagração do autoritário na nossa amada Volta Redonda.

*Adelson Vidal Alves é historiador e editor do blog Voz Liberal

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