“Enquanto nossos filhos enfrentam salas de aula sufocantes, quem decide sobre isso está no conforto do ar-condicionado”, desabafa uma mãe. A cena tem se repetido em várias escolas de Volta Redonda, onde a falta de climatização adequada compromete o aprendizado e a saúde dos estudantes.
Na última semana, uma estudante da Escola Municipal Pará, no bairro Retiro, desmaiou em sala de aula devido ao calor insuportável, segundo relatos recebidos pela Folha do Aço. O episódio ilustra um problema estrutural grave que afeta não apenas Volta Redonda, mas também cidades vizinhas, levando prefeituras a adotarem medidas emergenciais para minimizar os impactos das altas temperaturas.
Medidas emergenciais
Diante do calor extremo, a secretaria municipal de Educação de Volta Redonda alterou o horário de funcionamento das escolas municipais entre os dias 17 e 19 de fevereiro, além de suspender atividades ao ar livre e estabelecer pausas para hidratação. A recomendação foi para que os alunos levassem garrafas de água. As aulas retornaram ao horário normal na quinta-feira (dia 20), mesmo com a permanência das altas temperaturas.
Porém, a questão central permanece sem solução definitiva: das 110 escolas municipais da Cidade do Aço, apenas 25 possuem ar-condicionado funcionando. Isso significa que 75% das unidades ainda operam sem climatização adequada, expondo alunos e professores a temperaturas elevadas.
O prefeito Neto (PP) afirmou, em entrevista ao programa Fato Popular, que o governo municipal iniciou a adequação elétrica em dez escolas e garantiu que até metade do ano todas as unidades terão ar-condicionado. “Querer é poder”, disse o chefe do Executivo.
Na sessão ordinária da Câmara Municipal, ocorria na terça-feira (dia 18), o vereador Raone Ferreira (PSB) utilizou a tribuna para criticar a demora e a falta de planejamento da gestão municipal. “É impossível um aluno aprender em uma sala de aula insalubre, com temperaturas chegando a 31,5°C. Já fiscalizei mais de 40 escolas e a realidade é triste. Algumas salas têm ar-condicionado há cinco anos, mas os aparelhos estão desligados porque a rede elétrica precisa de reforma. Isso é um desperdício de dinheiro público!”, afirmou.
O parlamentar também criticou o fato de que, enquanto os alunos sofrem com o calor, “o gabinete do prefeito segue fresquinho, assim como outros setores públicos, inclusive a Câmara Municipal”.
A situação em outras cidades
O problema vai além de Volta Redonda. Em cidades vizinhas, milhares de alunos também enfrentam o calor extremo, levando prefeituras a adotarem medidas paliativas para evitar colapsos nas unidades escolares:
Barra Mansa: Diante de temperaturas que chegaram a 41°C (sensação térmica de 44°C), a Prefeitura suspendeu as aulas da tarde e da noite até nesta sexta-feira (dia 21). Apenas o turno da manhã foi mantido, até as 10h30min. No município, apenas nove das 69 unidades municipais possuem ar-condicionado.
Pinheiral: As aulas no turno da tarde foram suspensas, e as creches passaram a funcionar apenas até as 11h. No município, nenhuma escola tem ar-condicionado; apenas as creches possuem o equipamento.
Barra do Piraí: A Prefeitura reduziu a carga horária das aulas, suspendendo os turnos da tarde e da noite até o dia 21. O município conta com 38 escolas públicas, nenhuma delas climatizada. A prefeita Kátia Miki (SD) foi a Brasília buscar emendas e recursos para climatização. “A climatização das escolas é uma prioridade”, afirmou.
O alerta do Sepe e as ações do Estado
O Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe) cobrou providências urgentes diante das condições precárias nas escolas públicas do Rio de Janeiro. Segundo a entidade, a situação é crítica especialmente nas cozinhas das unidades.
A secretaria de Estado de Educação (Seeduc) informou que, das 1.234 escolas estaduais, 200 estão sem ar-condicionado. O governo estadual prometeu climatizar 180 unidades em até 90 dias, além de reforçar ventiladores e reduzir a carga horária em algumas escolas.
Falta de planejamento urbano agrava o problema
Além da demora na instalação de ar-condicionado nas escolas, o engenheiro civil José Marcos Rodrigues Filho, o Zito, destaca que a situação reflete uma falta de planejamento urbano. “No passado, o ambiente urbano era mais equilibrado, com circulação de ar e ruas arborizadas. Hoje, com o desmatamento e a alta densidade urbana, a climatização passou a ser uma necessidade básica”, explica.
Zito, que é mestre no ensino em Ciências da Saúde e do Meio Ambiente, alerta que, em algumas salas de aula sem ventilação adequada, a temperatura pode ultrapassar 42°C. “Salas com telhados de fibrocimento sem laje são verdadeiros fornos. E, enquanto não houver planejamento sustentável para reduzir o impacto ambiental e térmico nas cidades, esse problema só vai se agravar”, afirma o engenheiro.
Para ele, a instalação de ar-condicionado é uma medida necessária, mas deve vir acompanhada de um debate sobre sustentabilidade energética. “Enquanto medidas estruturais não forem adotadas, a cada onda de calor os alunos continuarão sendo os mais prejudicados”, conclui.