O pesadelo da comerciante Alessandra Aparecida Paulino, conhecida como Tia Chica, mãe de Johnatan Gilberto Paulino da Silva, parecia ter um desfecho no último dia 18 de outubro, quando finalmente recebeu a confirmação de algo que sempre soube: o corpo sepultado como “não identificado” em Vargem Alegre, distrito de Barra do Piraí, era mesmo o de seu filho. No entanto, a luta por justiça e dignidade para Johnatan apenas começou, em uma jornada marcada pelo desamparo e descaso das autoridades.

A história teve início em 19 de dezembro do ano passado, quando o rapaz de 34 anos saiu de casa, em Volta Redonda, dizendo que iria para a casa da namorada. “Achei que ele tinha voltado e deitado, mas quando acordei, às cinco da manhã, ele não estava lá”, relembra Tia Chica, que passou a procurá-lo incansavelmente.

No dia 23 de dezembro, um corpo foi encontrado boiando em Barra do Piraí. “Eu vi e disse: ‘é meu filho'”, conta ela. Seu filho mais novo chegou a ir ao Instituto Médico Legal (IML) com fotos do irmão, mas, segundo familiares, os funcionários garantiram que o corpo não era dele. Nas palavras de Tia Chica, “o meu Deus falava: é o teu filho, ele está lá”.

Apesar de retornar ao IML várias vezes e de insistir no reconhecimento, Tia Chica sempre recebia a mesma resposta: aquele corpo não era de Johnatan. Enquanto isso, a cidade inteira se mobilizava em busca do taxista, conhecido como “Chuchu”, enquanto ele, sem identificação, já havia sido enterrado como indigente.

Somente três meses depois, após insistentes pedidos e a ajuda de um funcionário sensibilizado pela sua dor, Tia Chica descobriu a verdade: Johnatan fora sepultado como indigente. Ela então iniciou o processo para comprovar a identidade do filho através de um exame de DNA, concluído apenas em outubro, quando o material genético coletado do pai de Johnatan confirmou a identidade.

“Perdi meu filho duas vezes”

Para Tia Chica, o sofrimento de perder o filho foi agravado pelo descaso das autoridades. “Perdi meu filho duas vezes. Primeiro, quando ele caiu no rio, e depois, ao descobrir que seu corpo foi enterrado como um bicho, sem nome e em um local que nem sei onde é”, afirma.

Apesar da confirmação do DNA, ela ainda enfrenta a burocracia para retificar a certidão de óbito de Johnatan, que atualmente consta como “dados ignorados”. A mãe agora luta para dar um sepultamento digno ao filho e expressa a dor de ver o sofrimento prolongado. “Era só ter um pouco mais de cuidado, um pouco mais de atenção. Olha o transtorno e o dano que isso causou para mim e minha família”.

O drama de Tia Chica mobilizou a comunidade e o Movimento Ética na Política de Volta Redonda (MEP-VR). José Maria da Silva, o Zezinho, um dos idealizadores da entidade, acompanhou o caso junto a líderes comunitários e ao Núcleo de Práticas Jurídicas da Universidade Federal Fluminense (UFF), além do apoio do padre Juarez Sampaio.

“A dignidade humana precisa ser preservada mesmo na morte. Este é um princípio básico e constitucional”, afirma Zezinho. O delegado adjunto da 93ª DP (Volta Redonda), José Carlos Neto, ao entregar o laudo confirmando a identidade de Johnatan, destacou que situações como essa não devem se repetir. “Em qualquer caso semelhante, podem me procurar, para que não ocorram mais casos como este”, salientou Neto.

A dor de Tia Chica, que afirma a todo instante não querer prejudicar ninguém, reflete o sofrimento de outras mães e famílias que, diante da perda, enfrentam obstáculos para enterrar seus entes queridos com dignidade. A comerciante, que acabou fechando seu estabelecimento em Volta Redonda, lamenta o impacto que essa tragédia teve sobre toda a sua família. “Minha família inteira ficou doente da alma, do coração, do corpo. Só quero que esse sofrimento acabe para todos nós”.

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