Como há anos não acontecia na Usina Presidente Vargas, em Volta Redonda, o chão de fábrica da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) ficou agitado nos últimos dias, com o movimento de parte de trabalhadores da Gerência de Manutenção Central (GMC) cobrando melhorias nos salários e benefícios oferecidos pela empresa. Por dois dias consecutivos, o grupo promoveu manifestação no interior da fábrica.

Sem a participação oficial dos sindicatos dos Metalúrgicos e da Construção Civil, o movimento dos trabalhadores – de forma independente – reivindica uma pauta de negociação semelhante à apresentada pelos companheiros da CSN Mineração: PPR de R$ 10 mil (a ser pago até 30/04), reajuste salarial de 30%, além da correção do INPC (em 2021 o índice acumulado foi de 10,16%).

Em outro item é exigido reajuste do valor do cartão alimentação para R$ 800, pagamento de hora extra mensal e plano de saúde nacional. A data-base do acordo seria referente a 1º de maio. 

Proposta

Com a temperatura elevada na Usina, a CSN antecipou a abertura das negociações com a categoria, apresentando na quarta-feira (dia 6) proposta de renovação do Acordo Coletivo 2022/2023. O reajuste salarial coletivo proposto para os admitidos até 30 de abril deste ano é de 8,1% para quem recebe até R$ 3 mil. Para os demais o índice seria de 5%.

A empresa oferece também uma carga extra no cartão alimentação, no valor de R$ 800, divididos em duas parcelas de R$ 400. A primeira a ser creditada em até cinco dias úteis após a assinatura do acordo e a segunda a ser paga em 16 de dezembro deste ano.

Outra proposta sugerida pela CSN é de crédito extra de R$ 700,00 para colaboradores que registram ponto, e supervisores e coordenadores serão elegíveis. Já o abono referente ao PPR é da ordem de 76% do target. Os benefícios seriam realizados em até cinco dias úteis após a assinatura do acordo.

“A CSN desde sempre está aberta a negociações, seguindo os ritos das normas trabalhistas. Sendo a data-base do sindicato metalúrgico 1º de maio, o acordo está dentro do período previsto”, garante o grupo liderado pelo empresário Benjamin Steinbruch, por meio do boletim Chama.

A proposta de renovação do Acordo Coletivo foi apresentada ao Sindicato dos Metalúrgicos, que apesar de contrariado com os índices propostos pela CSN, imediatamente marcou a votação em escrutínio secreto. Com isso, os trabalhadores já nesta sexta-feira (dia 8) decidirão se aceitam ou não os valores. As urnas serão instaladas na Praça Juarez Antunes, próxima a Passagem Superior, na Vila, de 6 às 16h. 

Representatividade

No início da noite de quinta-feira, a empresa emitiu novo comunicado, reforçando o interesse de manter aberta a negociação com os seus empregados, por meio de seus representantes legais, para reuniões que envolvam os interesses dos trabalhadores.

“Cabe reforçar que, de acordo com a legislação, a empresa só pode negociar o Acordo Coletivo com o sindicato legalmente constituído para representar os trabalhadores. Desta forma, a CSN não reconhece a legitimidade de movimentos paralelos que ocorrem durante a negociação sindical. Eventuais disputas sindicais e movimentos pontuais não podem interferir no processo natural de negociação. É importante permitir à totalidade dos empregados, democraticamente, exercer o seu direito de votação”, diz um trecho do comunicado.

Acusado de ter abandonado a categoria, o presidente da entidade, Silvio Campos, rebateu o movimento independente formado por trabalhadores.

“O Sindicato sempre esteve aqui e em hora nenhuma fomos chamados pelos trabalhadores ou nos procuraram para uma reunião para falar sobre a paralisação. Entendemos que o movimento se faz necessário frente ao que os trabalhadores estão passando, com dois anos de reajuste zero. É justo e concordo que tem que parar a empresa mesmo, mas isso tem que ser feito de forma responsável e legal, para que não traga prejuízos para esses funcionários”, disse o sindicalista, em entrevista coletiva à imprensa no final da manhã de quinta-feira (dia 7).

A orientação da direção do Sindicato é pela rejeição. “Já tínhamos a reunião marcada com Benjamim e fomos pegos de surpresa pela paralisação, o que motivou a apresentação dessa proposta. Estamos encaminhando para a rejeição e queremos que seja com mais de 90% para mostrar à empresa que não é nem de longe o que merecemos”, explicou o presidente do sindicato.

Interesse eleitoreiro

Para Silvio, o grupo que apoia e incentiva o ato tem interesses na eleição sindical e estão utilizando a indignação dos metalúrgicos para impulsionarem a candidatura. “Infelizmente, estão usando os trabalhadores de massa de manobra em função da eleição. Eles sabem que para uma greve há um rito e que, caso não seja cumprido, pode prejudicar os trabalhadores, e não vão dar respaldo quando isso acontecer”, afirmou.

O líder sindical reforça o entendimento que o Sindicato dos Metalúrgicos é o representante oficial da categoria junto à empresa. “Se tivermos que ir para greve, iremos, assim como fizemos em 2007, mas com a proposta rejeitada, a publicação do edital na Lei de Greve para que tenhamos respaldo judicial”, explicou.

O diretor jurídico do SindMetal, Jovelino Juffo, também alerta para os ritos necessários para uma eventual paralisação e os prejuízos que podem ser causados na produção da empresa.

“Os trabalhadores estão com razão em parar, mas têm que ser feito de forma correta. Tenho mais de 23 anos de empresa e posso afirmar que um movimento assim é perigoso. A empresa tem equipamentos que, caso desligados, podem gerar grande prejuízo, coisa de seis meses parados, como o alto-forno. E esses trabalhadores vão fazer o que neste período? Por isso uma greve deve ser planejada. É preciso ver quais áreas precisam continuar funcionando, e tudo mais. Isso não é defender a empresa, é ter responsabilidade com todos. Estamos aqui para, antes de tudo, defender os trabalhadores”, garante Jovelino.

A entidade sindical informou, inclusive, que está realizando pesquisa para apurar os itens da pauta de reivindicação para o Acordo Coletivo 2022 da CSN. “Estamos elaborando a pauta para levar à empresa, que é o processo que fazemos sempre. Os trabalhadores têm a chance de colocar o que querem e nós sempre escutamos. Sabemos que os dois anos sem reajuste levaram a uma situação limite e até ao movimento de greve e entendemos que se a empresa não apresentar uma proposta justa, é para a paralisação que vamos encaminhar”, afirmou o presidente Silvio Campos.

No início da noite de quinta-feira, dois representantes do grupo que promoveu manifestações ao longo da semana no interior da Usina Presidente Vargas estiveram na sede do SindMetal, no  Centro, onde entregaram uma pauta de reivindicações. Um dos emissários foi o líder oposicionista Edimar Miguel Pereira Leite.

O documento com 61 itens deixa a entender a legitimidade de negociação da atual diretoria do Sindicato e sinaliza com o pedido de que nenhuma punição seja aplicada aos trabalhadores que estão participando do processo da campanha salarial. Também no final da tarde de quinta, de forma pacífica, manifestantes fizeram uma passeata da Vila até a sede do Sindicato. O detalhe é que o expediente da entidade já tinha encerrado. O grupo foi acompanhado por viaturas da Polícia Militar e da Guarda Municipal.  

 Lei de Greve

“É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”, diz o artigo 9°, da Constituição Federal de 1998, que garante o direito de greve no Brasil. Todavia, como é basilar, não se trata de um direito absoluto, cabendo aos trabalhadores e respectivos sindicatos, para exercê-lo regularmente e não tê-lo como abusivo, cumprir alguns requisitos legais.

No Brasil, para se reconhecer o exercício regular da greve, requer-se, de acordo com a Lei 7.783/89, o cumprimento dos seguintes requisitos:

1 – Convocação e/ou realização de assembleia geral da categoria;

2 – Cumprimento de quórum mínimo para deliberação;

3 – Exaurimento da negociação coletiva sobre o conflito instaurado;

4 – Comunicação prévia aos empresários e à comunidade (nas greves em serviços essenciais);

5 – Manutenção em funcionamento de maquinário e equipamentos, cuja paralisação resulte prejuízo irreparável;

6 – Atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade (nas greves em serviços essenciais);

7 – Comportamento pacífico;

8 – Garantia de liberdade de trabalho dos não grevistas;

9 – Não continuidade da paralisação após solução do conflito por acordo coletivo de trabalho, convenção coletiva ou sentença normativa.

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