Um mundo mais inclusivo e acolhedor para pessoas no espectro do autismo é o desejo que permeia o Dia do Orgulho Autista, celebrado em 18 de junho. Nessa data, o movimento visa dar voz à diversidade, às lutas e aos triunfos de indivíduos com autismo, destacando histórias de superação e sensibilizando a sociedade sobre a importância da inclusão e do respeito. Afinal, o autismo não define uma pessoa, mas sim a sua incrível jornada de autenticidade, em busca de aceitação e compreensão.
O autismo, também conhecido como Transtorno do Espectro Autista (TEA), é uma condição neurobiológica que afeta o desenvolvimento humano. Caracteriza-se por dificuldades na interação social, comunicação e comportamentos restritos e repetitivos. O autismo abrange um amplo espectro, o que significa que os indivíduos podem apresentar uma grande variação nos sintomas e no grau de comprometimento.
O TEA atinge de 1% a 2% da população mundial e, no Brasil, aproximadamente dois milhões de pessoas. Mas é importante destacar que cada pessoa com autismo é única e merece apoio em sua jornada de desenvolvimento.
A dona de casa Márcia do Carmo Freitas e o repórter cinematográfico Evandro Freitas sabem bem disso. O casal de Volta Redonda revela uma jornada singular que trilham diariamente, enfrentando desafios e limitações com dedicação incansável e um amor incondicional. Pais de Evandro Junior Freitas, de 12 anos, eles reconhecem a importância de respeitar os limites do filho e ensiná-lo sobre o mundo à sua volta.
“Ter um filho autista é uma experiência única, porque existem muitos desafios. Temos que respeitar os limites deles e ensinar sempre como as coisas ao redor funcionam. São inteligentes, mas limitados. Eles veem as coisas nos mínimos detalhes. A maioria deles não gosta de barulhos, escuros, ambientes com muitas pessoas ou lugares com som alto. Precisam de apoio de profissionais da saúde para melhor interagir na sociedade”, destaca Márcia.
Para a mãe de Evandro Junior, a maior alegria é presenciar a evolução do reflexo das terapias respondidas positivamente na vida dele. “Nosso filho é assistido desde que fechou o laudo com autismo. Seus tratamentos são contínuos e a inclusão escolar também é uma parceira na evolução na vida dele. Em casa, educamos sempre com conversas e explicações, olhando bem nos olhos dele e impondo limites necessários, fazendo entender o certo e o errado. Nossa abordagem a ele é sempre com calma e em tom baixo”, acrescenta Márcia, ressaltando que a calma é essencial para que o seu filho se sinta seguro e amado, evitando reações agressivas e crises.
O casal expressa preocupação diante da falta de empatia, deboche e descaso que muitas vezes enfrentam na comunidade. “Precisamos de mais apoio na área de saúde, uma inclusão com mais empatia e escolas preparadas para recebê-los”, frisou Evandro, se destacando como um pai exemplar, “que deseja um mundo onde as particularidades dos autistas sejam valorizadas”.
Do ponto de
vista profissional
“Falou em autista, eu compro briga, eu mostro lei e faço os pais exigirem seus direitos”. A fala é da psicopedagoga Leondina Zanut, conhecedora no assunto e com carinho especial pela causa que vai além das obrigações profissionais. ‘Tia Léo’, como é carinhosamente chamada pelos pacientes, reforça que a data – 18 de junho – foi instituída para esclarecer a situação do autismo como uma condição.
“Não é doença, é uma condição, que pode ter três níveis. E essas pessoas não podem ser excluídas. Crianças com autismo têm uma condição diferenciada da nossa. O que eles mais precisam é de amor, acolhimento e de órgãos competentes que cuidem deles, porque nem todos têm condições de arcar com as linhas de atendimento”, destaca a profissional.
O Dia do Orgulho Autista é um reforço ao Dia do Autismo, celebrado em 2 de abril. Segundo a psicopedagoga, o olhar da sociedade para a condição está mudando, graças à essas datas e movimentos de conscientização. “Felizmente, temos, no Brasil, muitos cuidados e benefícios que em outros países não há, como carteirinhas para a pessoa com TEA, vagas de estacionamento reservadas, direito ao assento, fila privilegiada. Fora as leis criadas para garantir e ampliar os direitos dessas pessoas”, observa Leondina.
As principais legislações as quais a profissional se refere são: a Lei Romeo Mion (13.977/2020), que estabelece a emissão da Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (CipTEA) e facilita o acesso das pessoas com autismo aos direitos previstos na Lei Berenice Piana (12.764/2012), que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com TEA. As duas propostas visam garantir que todo o indivíduo com o espectro tenha atenção integral, pronto atendimento e prioridade no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas de saúde, educação e assistência social.
As normas também asseguram que essas pessoas sejam reconhecidas, estabeleçam suas condições perante a sociedade, além de dispensar o dever de explicar a todo o momento a própria condição. Outra lei que muitos desconhecem é a Lei 8.112/90, que possibilita a redução de carga horária da jornada de trabalho para servidores públicos, pais de autistas.
“As pessoas não sabem disso, não recorrem, e falam que não levam o filho para a terapia porque não têm tempo. É lei. As pessoas precisam ser melhores informadas e correrem atrás de seus direitos”, adverte Leondina Zanut. “A sociedade só não faz mais porque não quer. Planos de saúde, por exemplo, são obrigados a cobrir todos os atendimentos e terapias, mas não cobrem ou nunca têm vaga. A medicação também é muito cara e muitas famílias não têm acesso. Vale destacar que, dentro do diagnóstico clínico, o autismo precisa ser baseado em evidências científicas”, completa.
No início deste mês, o governador Cláudio Castro (PL) sancionou a Lei 10.031/23 que obriga as unidades de saúde públicas e privadas do Estado do Rio a utilizarem e aplicarem o questionário M-CHAT (Modified Checklist for Autism in Toddlers) para prever o rastreamento de sinais precoces do autismo.
“É necessário reconhecer o transtorno do espectro autista desde cedo, para melhor acompanhamento e acolhimento. Temos implementado diversas políticas públicas com o objetivo de proporcionar melhor qualidade de vida, tanto para quem tem o transtorno, quanto para a família”, explicou o governador na ocasião da sanção.
De autoria do presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), deputado Rodrigo Bacellar (PL), a norma consiste em um questionário M-CHAT que deverá ser aplicado no atendimento a crianças entre 16 e 30 meses, para obter um diagnóstico precoce do Transtorno do Espectro Autista (TEA). O M-CHAT é um questionário com 23 itens, e pode ser utilizado por qualquer profissional de saúde, sendo recomendado pelo Ministério da Saúde.