Aliados no campo político até bem pouco tempo, o prefeito Neto (DEM) e o ex-governador Sérgio Cabral voltaram a figurar juntos no mesmo noticiário. Dessa vez, o “encontro” não foi motivado por alguma inauguração ou recepção com cardápio árabe na casa do político volta-redondense.

Conteúdos de uma delação premiada explosiva de Cabral, divulgados em toda a imprensa nacional, apontam para um possível beneficiamento do prefeito de Volta Redonda, em decisão proferida pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com a revelação, o magistrado mudou seu voto em julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2015, em um dos dois processos em que o ex-governador diz que Toffoli vendeu sua decisão em troca de pagamentos ilegais.

A Polícia Federal solicitou ao STF a abertura de investigação para apurar as revelações. Segundo Cabral, Toffoli recebeu R$ 4 milhões em troca de decisões favoráveis a dois prefeitos fluminenses. Desse valor total, diz o delator, R$ 3 milhões foram pagos para favorecer Neto.

Ainda segundo o delator, os repasses tiveram o envolvimento do escritório da mulher de Toffoli, a advogada Roberta Rangel. O ministro da Suprema Corte reagiu, por meio de nota, sobre as supostas declarações do ex-governador do Rio de Janeiro, afirmando que “jamais recebeu valores ilegais ou atuou para favorecer qualquer pessoa no exercício de suas funções”. Ele disse também que, quanto ao mencionado processo, “a decisão respectiva foi proferida pela maioria do colegiado”.

História

Neto foi cassado em agosto de 2013 pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ) por abuso de poder político e econômico. Ele teria veiculado propaganda em outdoors, no site da prefeitura e em placas espalhadas na cidade nos meses próximos à eleição. Após a decisão na instância estadual, o chefe do Palácio 17 de Julho recorreu ao TSE, à época presidido por Toffoli.

O ministro, em 7 abril de 2015, votou contra um recurso especial apresentado pela defesa do prefeito de Volta Redonda e desempatou o julgamento, mantendo a sua cassação por 4 votos a 3. Neste período, Neto chegou a deixar o cargo por dois dias, período em que a então presidente da Câmara, vereadora América Tereza, assumiu a principal cadeira do Poder Executivo do município.

Um vídeo que circulou nas redes sociais durante a semana mostra a sessão de julgamento em que Toffoli não leu seu voto e apenas indicou que acompanharia a relatora Maria Thereza de Assis Moura pela manutenção da cassação. Entretanto, dois meses depois, em 23 de junho, Toffoli mudou de posição quando o plenário do TSE analisava um embargo de declaração (espécie de recursos finais da defesa) de Antônio Francisco Neto.

O ministro acatou um embargo de declaração apresentado pela defesa e desempatou novamente, mas em favor do prefeito. “Estou entendendo que é o caso de reenquadramento e valoração das provas. E nesta revaloração eu considero que não houve o abuso”, disse em seu voto.

A mudança de posição de Toffoli chamou a atenção da ministra Maria Thereza de Assis Moura, que pediu a palavra. “Apenas o que eu já disse: nós, a meu ver, estamos ‘rejulgando’ o caso. Mas esta é a decisão do pleno, que eu aceito”, disse ela. A surpresa da ministra se deu porque, em tese, os embargos de declaração não servem para reexaminar o mérito do julgamento.

Versões

Ao jornal Folha do São Paulo, o prefeito Neto negou que seu julgamento no TSE tenha envolvido qualquer pagamento ilegal. “Eu te garanto que jamais aconteceu isso. Se você pegar a votação anterior do ministro, ele fala que em casos duvidosos que não deveria tirar um prefeito do cargo. Eu não sei da onde o Cabral citou isso. E o embargo de declaração foi, justamente, por ele ter dito isso”, disse.

Ainda de acordo com o jornal paulista, a defesa de Sérgio Cabral divulgou uma nota na quarta (dia 12) em que defende o acordo de colaboração premiada assinado com a Polícia Federal e a abertura de inquéritos com base nos relatos do ex-governador do Rio de Janeiro.

Segundo o texto assinado pelo advogado Márcio Delambert, Cabral entregou uma “oceânica quantidade” de elementos que deveriam ser investigados. “Surpreende a resistência daquilo que seria óbvio, abrir uma investigação criminal diante da oceânica quantidade de elementos que precisam ser apurados”, diz a defesa.

O ministro Edson Fachin marcou para o próximo dia 21 o julgamento no plenário virtual do STF sobre a validade da delação do ex-governador. Os ministros vão analisar um recurso da Procuradoria-geral da República.

O advogado de Cabral afirma que o acordo foi homologado pelo STF porque está “rigorosamente dentro da legalidade” e que seu cliente “narrou com riqueza de detalhes e extrema simplicidade” os casos em que teve participação. Sobre a contrariedade da PGR, a defesa argumenta na nota que o Ministério Público em nenhum momento disse “textualmente que não queria celebrar acordo” com Cabral.

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