Quatro meses após deixar o cargo de superintendente no Amazonas em conflito com o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, o delegado da Polícia Federal Alexandre Saraiva admite acreditar na interfrência do presidente Jari Bolsonaro (sem partido) na Polícia Federal. A declaração foi dada nesta quinta-feira (dia 26), em entrevista exclusiva de Saraiva ao jornal Folha do Aço

“Acho que acontecem coisas, hoje, na PF que são extremamente incomuns. Por exemplo, eu fiz essa notícia-crime contra o Ricardo Salles, no dia seguinte eu fui exonerado. Pode ter sido uma coincidência? Pode. Aí outro colega, em outro inquérito junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), também investiga o Ricardo Salles. Esse cara aí que ia ser promovido a 03 da Superintendência do Distrito Federal, a promoção dele é suspensa, arquivada e sobre os motivos se colocam sigilo de 100 anos. Ele era chefe da Delegacia de Combate à Corrupção e foi destituído. Ele não foi promovido e foi retirado da Delegacia. Em seguida, o chefe da Divisão de Meio Ambiente da PF, delegado Rubens [Lopes da Silva], que trabalhou comigo, foi afastado também. Fica difícil acreditar que não existe algum tipo de força que está atuando contra aqueles que promoveram uma investigação. E eu digo, não só contra o ministro [Salles]”, exemplificou. 

Em 20 de abril, Saraiva foi exonerado da Superintendência da PF no Amazonas, após encaminhar ao Supremo Tribunal Federal uma notícia-crime contra o Salles e o senador Telmário Mota (PROS-RR). O delegado Leandro Almada da Costa assumiu o cargo, enquanto Saraiva foi transferido para a delegacia de Volta Redonda, no Sul do Estado do Rio de Janeiro.

Inquérito conduzido por Saraiva apontou que Salles e Mota pertenceriam a uma organização criminosa que estaria praticando crimes de advocacia administrativa. O documento cita que eles fizeram um acordo com o setor madeireiro “no intento de causar obstáculos à investigação de crimes ambientais e de buscar patrocínio de interesses privados e ilegítimos perante a Administração Pública”.

O delegado atribui a sua saída da Superintendência da Amazônia para Volta Redonda a interferência de Bolsonaro. “Isso é um sentimento pessoal meu, mas eu diria que sim. A percepção que ficou foi essa [interferência]. Digo isso, pois na época eu até evitava afirmar isso, porque não tinha acontecido ainda outras duas exonerações. Poderia ser uma movimentação que, querendo ou não, acontece quando se muda diretor-geral. Naquela época tinha mudado, mas na sequência, essas duas outras, fica difícil não pensar nessa hipótese”, afirmou. 

Questionado sobre o último contato com o presidente da República, o delegado Alexandre Saraiva disse que aconteceu em outubro do ano passado, quando ele participou de uma transmissão semanal ao vivo conduzida por Bolsonaro. “Fui para a live e, tudo que falei na live com o presidente, eu sustento e falo com toda certeza. Foi um posicionamento técnico. Foi a última vez que eu falei com ele”, garantiu. 

Sobre o novo titular da pasta do Meio Ambiente, Joaquim Alvaro Pereira Leite, o ex-superintende da PF no Amazonas diz desconhecer até mesmo o nome. Saraiva, que teve o nome cotado para assumir o ministério no início do governo Bolsonaro, analisa que a atuação de Leite é semelhante ao Salles.

“Eu nem sei o nome desse ministro, o que eu sei é que é idêntico. Vou te dar um exemplo. Tem um sistema que é fundamental para a gente controlar o desmatamento, chamado Sisdoc. É um sistema em que nós da PF, Receita Federal e Polícia Rodoviária Federal verificamos se a madeira que está circulando, que vai ser exportada, tem origem lícita. Esse sistema está fora do ar desde março. Isso é um absurdo. Você imagina, em uma comparação, se a Polícia Militar, de uma hora para outra, não tivesse mais acesso ao sistema do Detran para verificar se um carro é roubado. E é isso que está acontecendo e eu já falei diversas vezes, e não acontece nada para mudar isso”, comparou. 

Sobre a possibilidade de se aventurar nas eleições do próximo ano a um cargo eletivo, o delegado Alexandre Saraiva mesmo com tom conservador, não descarta a possibilidade. Convites de filiação de lideranças partidárias, inclusive, já chegaram até a ele.

“Hoje, eu me vejo primeiro como policial. Também me vejo como um pesquisador das questões relacionadas ao meio ambiente. Isso já é muita coisa para minha cabeça”, pontuou ele, que tem o título de eleitor registrado no município de São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. “Eu, sinceramente, não parei para pensar seriamente na possibilidade, não me vejo nisso. Mas a gente não sabe no dia de amanhã”.  

Foto: Evandro Freitas

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