Apesar da proximidade com Lula, Neto evita viagem a Brasília e recorre a ofício para pedir apoio para conter crise no aço

Mesmo diante de uma crise que ameaça diretamente uma das principais bases econômicas de Volta Redonda, o prefeito Neto (PP) mais uma vez optou por não ir a Brasília. Em vez disso, recorreu a um ofício para cobrar do governo federal medidas urgentes de proteção à indústria do aço – setor que emprega milhares de trabalhadores no município e tem sofrido com o aumento de tarifas sobre exportações aos Estados Unidos e a entrada crescente de aço chinês no mercado nacional.

No documento, enviado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na última quarta-feira (dia 4), Neto alerta para os efeitos “imediatos” das recentes decisões no mercado internacional sobre a cadeia produtiva local. Embora dirigido a Lula, o nome do presidente não aparece sequer uma vez na nota oficial distribuída à imprensa pela Secretaria de Comunicação da Prefeitura de Volta Redonda.

A escolha pode não ser apenas um detalhe de estilo institucional: há quem veja no gesto uma tentativa deliberada de evitar nova exposição pública da relação entre Neto e Lula – como ocorreu em 2022, quando o prefeito foi duramente criticado por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) após participar de uma reunião com o petista.

O tom institucional, no entanto, deixa clara a gravidade do cenário. “Já observamos congelamento de contratações e uma revisão de investimentos. O impacto é imediato na vida do trabalhador, que está na ponta da cadeia produtiva”, afirmou o prefeito no ofício.

Ausente até nos momentos críticos

Apesar da relevância do tema, que tem mobilizado governadores, prefeitos, parlamentares e representantes da indústria em reuniões na capital federal, Neto, em seu sexto mandato como prefeito, preferiu não se deslocar a Brasília. A postura não surpreende quem acompanha sua trajetória política: o próprio chefe do Palácio 17 de Julho admite publicamente que evita grandes deslocamentos, sobretudo de avião.

Em mais de duas décadas à frente da administração municipal, são raras as ocasiões em que esteve na capital federal para tratar diretamente de pautas, inclusive relacionadas a áreas fundamentais, como saúde, educação e geração de emprego.

Neto e Lula

Apesar dessa distância física e de tentar esconder a proximidade com o governo Lula, Neto participou, em março de 2022, de uma reunião fechada no Rio de Janeiro com o então pré-candidato do PT, articulada pelo ex-presidente da Alerj, André Ceciliano (PT). O encontro, revelado à época pela revista Veja, reuniu dez prefeitos fluminenses em um esforço de aproximação política do petista com lideranças fora do seu campo tradicional de apoio.

Às vésperas da eleição presidencial, a conversa teve como pano de fundo a captação de apoio em municípios estratégicos, como Volta Redonda, sede da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Na ocasião, após a imprensa noticiar sua participação no encontro, Neto afirmou que “Lula foi um presidente que ajudou muito Volta Redonda”.

O chefe do Executivo da Cidade do Aço, porém, foi duramente criticado pela ala bolsonarista. Ainda naquele momento, tratou de sinalizar disposição para dialogar com outros grupos políticos que disputavam a presidência.

“Se me convidarem para conversar com Ciro [Gomes] ou com [Jair] Bolsonaro, eu irei sem problema nenhum. Meu partido é Volta Redonda. O Neto não precisa da ajuda de ninguém, mas Volta Redonda precisa muito”, disse.

Mais recentemente, no último mês de abril, Neto voltou a encontrar o presidente Lula, desta vez em um almoço na residência do prefeito de Piraí, Luiz Fernando Pezão (MDB). O encontro foi reservado e contou com a presença de outras lideranças fluminenses.

Crise no aço

Desde o anúncio da nova tarifa de 25% sobre o aço brasileiro pelos EUA, no fim de maio – que, na prática, dobra para 50% ao considerar a medida anterior -, a preocupação se espalhou entre os principais polos produtores do país. A entrada de aço chinês, vendido a preços mais baixos e considerados desleais pela indústria nacional, agrava ainda mais a situação.

Dados do Instituto Aço Brasil apontam que, entre janeiro e abril deste ano, as importações de aço da China cresceram 22% em relação ao mesmo período de 2024. O setor emprega hoje mais de 110 mil trabalhadores em todo o país, sendo milhares deles em Volta Redonda, diretamente ligados à operação da CSN.

A Prefeitura aponta que, somente em 2024, cerca de 18% da receita internacional da empresa teve origem nas exportações para os Estados Unidos, agora sob ameaça.

Pautas e reivindicações

No ofício enviado ao Palácio do Planalto, Neto propõe uma série de medidas para tentar frear os impactos sobre a economia local. Entre elas, a abertura de processos de defesa comercial – como ações antidumping e salvaguardas temporárias -, reforço na diplomacia com os EUA, criação de um grupo interministerial para monitorar o setor e medidas emergenciais de apoio aos trabalhadores e aos municípios afetados.

“É nas cidades que esses impactos chegam com mais força. Precisamos proteger a nossa indústria e os empregos do nosso povo”, conclui o prefeito no texto. A administração municipal informou ainda que segue à disposição do Governo Federal para colaborar com dados e propostas que contribuam com a construção de uma resposta à crise.

CSN e relação com Neto

A CSN, uma das principais empresas da cidade, é uma das diretamente prejudicadas pelas sanções impostas no mercado internacional, que afetam a competitividade do aço brasileiro. A relação do prefeito Neto com a companhia, especialmente com o empresário Benjamin Steinbruch, presidente da empresa, sempre foi marcada por momentos conturbados.

Desde seu retorno à Prefeitura, em janeiro de 2021, Neto tem adotado um tom mais cordial com a direção da CSN. Até mesmo em uma pauta que gera muito debate em Volta Redonda – a questão da poluição ambiental – o prefeito tem evitado declarações polêmicas sobre a responsabilidade da empresa, buscando manter uma relação mais equilibrada.

Foto: Divulgação

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