Acórdão da 4ª Turma Recursal do Rio de Janeiro manteve, por unanimidade, decisão que concedeu salário-maternidade a uma trabalhadora rural da Comunidade Quilombola Alto da Serra do Mar, situada no distrito de Lídice, em Rio Claro, no Sul Fluminense. O processo foi movido pela Defensoria Pública da União (DPU) por meio de uma ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que havia negado administrativamente a solicitação feita em 2016.

A DPU deu entrada no pedido de concessão do benefício junto à Justiça Federal sob o argumento de que se tratava de uma segurada especial quilombola. A agricultora, que nasceu na comunidade e teve seu filho lá, trabalhou no cultivo de milho, mandioca e hortaliças, bem como na criação de galinhas, até o final da gestação, por dificuldades financeiras. Ainda assim, o INSS negou o salário-maternidade, exigindo comprovação da qualidade de segurada especial e do cumprimento da carência, que diz respeito a um tempo mínimo de 10 meses trabalhados no meio rural.

A atuação da DPU no caso iniciou-se a partir de uma visita realizada à Comunidade Quilombola Alto da Serra do Mar, no âmbito do projeto “A Defensoria Vai Aonde o Povo Pobre Está”. A ação foi apresentada à Justiça em 2019, com resultado favorável. O INSS recorreu, mas a decisão foi mantida, beneficiando a trabalhadora, por meio de um acórdão proferido no último dia 30.

De acordo com o defensor público federal Cláudio Luiz dos Santos, que atuou no caso, “a cidadã é membro da comunidade quilombola e trabalha na agricultura em regime de economia familiar, desde muito tempo, não tendo como precisar uma data do início do exercício desta atividade, uma vez que no Quilombo as atividades da Associação são desenvolvidas desde a infância, juntamente com os pais responsáveis”.

Cláudio Santos explica ainda que ela exerceu a atividade de agricultora durante toda a sua vida, incluindo os 10 meses que antecederam o parto, de modo que cumpriu a carência necessária à concessão do benefício previdenciário pretendido, na condição de segurada especial.

Para comprovação do exercício de atividade rural, além do depoimento de duas testemunhas, foram juntados ao processo a declaração do presidente da Associação de Remanescente de Quilombo do Alto da Serra e o estatuto da associação, que comprovaram que ela integra a comunidade quilombola desde que nasceu, exercendo atividades agrícolas destinadas à alimentação de sua família.

Direito quilombola

Para fins de acesso aos benefícios da Seguridade Social, o quilombola tem qualidade de segurado especial e é considerado produtor rural, que exerce sua atividade individualmente ou em regime de economia familiar. Segundo jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 1a Região, ele consegue dar início à produção de prova material apresentando carteira de filiação à associação quilombola, certidão de nascimento na comunidade, declaração da associação e comprovante de endereço rural.

Conforme o artigo 71 da Lei 8.213/91, o salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social durante 120 dias, com início no período entre 28 dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação sobre a proteção à maternidade. No caso de segurada especial, a carência exigida é de 10 meses.

O quilombola é enquadrado como segurado especial pela Instrução Normativa INSS 77/2015, se residir em imóvel rural, ou em aglomerado urbano ou rural próximo, e desenvolver atividade agrícola, pastoril ou hortifrutigranjeira, individualmente ou em regime de economia familiar. O INSS define ainda que é segurada especial, desde que comprove o exercício de atividade rural, a pessoa quilombola afrodescendente remanescente dos quilombos que integra grupos étnicos compostos de descendentes de escravos, considerado segurado especial.

Atuação da DPU

A Lei Orgânica da Defensoria Pública dispõe que suas funções institucionais são, dentre outras, exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado. Portanto, cabe à Defensoria Pública a defesa dos interesses individuais e coletivos dos grupos vulneráveis que merecem a proteção especial do Estado, no caso, as comunidades quilombolas.

Além disso, a participação direta no procedimento de titulação da Defensoria Pública está prevista expressamente no Decreto 4.887/2008. Segundo esse documento, a Fundação Cultural Palmares prestará assessoramento aos órgãos da Defensoria Pública quando estes órgãos representarem em juízo os interesses dos remanescentes das comunidades dos quilombos, nos termos do art. 134 da Constituição.

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