Uma denúncia feita pelo vereador Raone Ferreira (PSB), na segunda-feira (dia 4), na Câmara Municipal de Volta Redonda, apontou um rombo de R$ 32 milhões na conta do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) do município. A acusação foi baseada no Relatório Resumido da Execução Orçamentária e, segundo o parlamentar, que é oposição ao governo do prefeito Neto (PP), será encaminhada ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ).

De acordo com Raone, o município recebeu pouco mais de R$ 222 milhões do Fundeb em 2023, mas empenhou R$ 254 milhões, resultando em um déficit de R$ 32,6 milhões nas contas. Ele afirma ter alertado o prefeito Neto, o secretário de Educação, Sergio Sodré, o Conselho Municipal de Educação e o Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb (CAC) sobre as irregularidades, mas não obteve resposta aos ofícios enviados em 2 de fevereiro de 2024.

“É absurdo um governo que se elegeu defendendo a reconstrução de Volta Redonda, não cumprir com a legislação educacional. A falta de eficiência e responsabilidade na utilização dos recursos da educação coloca Volta Redonda numa grave crise educacional”, manifestou Raone, que também é professor e Doutor em Educação pela PUC-Rio.

“Eu já fiscalizei 38 escolas municipais e encontrei situações absurdas: alunos sem aulas por conta de falta de manutenção das escolas, falta de cuidadores para alunos PCD’s, profissionais que se desligam da rede por conta dos péssimos salários, além de locais insalubres por conta do calor e mofo. Tudo isso é culpa da péssima gestão da educação do atual governo”.

Investigação

A investigação iniciou a partir de denúncias apresentadas ao TCE pelo parlamentar. A Corte de Contas emitiu uma decisão para que a prefeitura de Volta Redonda institui-se um grupo de trabalho sobre gastos em Educação, para o Município se adequar a legislação vigente.

Em outubro, o vereador protocolou um Requerimento e pediu cópia das atas da reunião desse grupo de trabalho e descobriu que a reunião não tinha sido documentada por meio de ata. No mesmo pedido, foi respondido que toda a documentação constava no Processo Administrativo 2207.

Novamente, em dezembro de 2023, Raone solicitou cópia do processo administrativo, mas, conforme ele, recebeu uma resposta que não condizia com o pedido. Tratava-se de um processo de aquisição de material de limpeza, higienização e “utencílios [sic]/cozinha” da secretaria municipal de Transporte e Mobilidade Urbana.

Tribuna

Na sessão da última segunda-feira (dia 4), o vereador, em discurso da tribuna, destacou a utilização errada da letra “c” na palavra utensílios para exemplificar a falta de transparência e competência da SME e da Prefeitura na administração municipal. Dessa forma, com a falta de informações oficiais sobre a utilização dos recursos, o vereador e sua equipe iniciaram uma investigação, que resultou na descoberta do possível rombo nas contas do Fundeb.

Histórico de problemas na gestão dos recursos da educação

O vereador Raone Ferreira já havia detectado falhas na aplicação dos recursos orçamentários em educação. Segundo a Constituição Federal, os municípios devem investir 25% da receita líquida em educação, mas a gestão do prefeito Neto teria aplicado apenas 13,2% em 2021, 8,9% em 2022 e 14,5% em 2023. Isso significa que, nos últimos três anos, o Município deixou de investir R$ 280,3 milhões na área.

As constantes falhas na gestão dos recursos do Fundeb e outros problemas contábeis na área da educação resultaram na rejeição das contas de Neto pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) em diversas ocasiões.

“A falta de investimentos na educação de Volta Redonda impacta diretamente na qualidade do ensino oferecido aos alunos da rede pública municipal. A insuficiência de recursos tem resultado na precarização da infraestrutura das escolas, falta de materiais básicos, salas de aula em mau estado, problemas na rede elétrica e hidráulica, entre outros. Além disso, Volta Redonda tem sido a única cidade da região que não paga o piso do magistério. No campo da educação especial faltam diversos cuidadores para acompanhamento das crianças PCDs nas escolas municipais”.

Sepe

O Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe) de Volta Redonda informou que acompanha as denúncias apresentadas pelo vereador Raone Ferreira. Em contato com a reportagem da Folha do Aço, a direção da entidade explicou que no momento está consultando o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) para compreender a situação mais atualizada.

Ressaltou também que o Fundo Nacional da Educação Básica (Fundeb) visa a valorização da Educação pública. “Infelizmente a destinação do fundo no município de Volta Redonda é um problema”, afirma. Ainda conforme o Sepe-VR, “atualmente toda a folha de pagamento dos profissionais de Educação do município é realizada com o Fundeb”.

No entanto, o problema estaria localizado em três questões, segundo entendimento do Sindicato. Uma delas é que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) determina que os municípios invistam no mínimo 25% da arrecadação na Educação, porém, a prefeitura de Volta Redonda não cumpre.

“Mesmo diante das denúncias realizadas pelo Sepe-VR, o prefeito Neto segue descumprindo o mínimo constitucional com aprovação da maioria dos vereadores da Câmara de Volta Redonda. Lembrando que Neto já havia sido declarado inelegível devido à reprovação das contas no governo anterior por manobras com dinheiro do Fundeb”, observa a entidade.

Por fim, o Sepe lembra que o Fundeb chega à categoria na forma de gratificação. “A política de gratificação exclui aposentados e pensionistas. Caso o Fundeb fosse incorporado ao salário dos servidores, haveria justiça salarial. Além disso, o Fundeb é usado como instrumento de opressão, sobretudo das mulheres servidoras, que em sua maioria são as responsáveis pelo cuidado médico e educacional dos seus filhos. Hoje uma trabalhadora da educação que necessite acompanhar o filho ou filha ao médico, por exemplo, deixa de receber a gratificação. Esse fato em si representa grande perda salarial”, pontua.

A entidade sindical finalizou informando que empreendeu nos últimos anos inúmeras tentativas de diálogo político, bem como ações judiciais. “O pagamento do piso do magistério em Volta Redonda não é cumprido, assim como o plano de carreira. A Prefeitura obtém uma das maiores arrecadações do sul do Estado, no entanto, segue como uma das poucas que não cumpre a lei. Essa lei existe há mais de 25 anos, e o Sepe segue desde então travando lutas para sua implementação”, conclui.

Secretaria municipal de Educação responde a denúncias sobre Fundeb

A Folha do Aço teve acesso ao Memorando n° 53/2024, da secretaria municipal de Educação, em resposta aos ofícios n° 178/2024 e n° 180/2024, de autoria do vereador Raone Ferreira (PSB). No texto, a pasta informou que após análise e conferência dos dados contábeis foram verificadas que há uma metodologia específica adotada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) na apuração do quadro do Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO) dos indicadores do Fundeb.

“Quando se analisa o quadro despesas com recursos do Fundeb no mesmo RREO, observa-se que os dados contábeis guardam paridade com os dados extraídos do E-cidade no Balancete da Despesa por órgão e por recursos”, diz o ofício com data de 19 de fevereiro de 2024.

A direção da pasta lembra que os valores foram publicados no Diário Oficial, trazendo a consolidação dos dados contábeis do demonstrativo das Receitas e Despesas com Manutenção e Desenvolvimento do Ensino dos seguintes órgãos: Fundação Educacional de Volta Redonda (Fevre), Fundação Beatriz Gama (FBG), Companhia de Habitação de Volta Redonda (Cohab) e Fundo Municipal de Educação (FME).

“Esclarecemos que os dados preenchidos pelos órgãos no Sigfis estão incluídos no quadro despesas com recursos do Fundeb no RREO, e que o quadro indicadores do Fundeb é uma totalização automática do próprio sistema do TCE-RJ”, destacada a SME. Sigfis é a sigla para Sistema Integrado de Gestão Fiscal, tecnologia utilizada no controle de contas públicas.

Conforme a ofício, comparando os valores apresentados no quadro, à soma das despesas empenhadas demonstra um montante de R$ 221 milhões e não o valor apresentado no RREO de R$ 254 milhões. “Desta forma, a diferença apresentada de R$ 32,6 milhões está divergente. O correto das despesas empenhadas e do valor é de R$ 223,6 milhões”, afirma.

Segundo a explicação da secretaria municipal de Educação, o valor de R$ 252 milhões também está divergente. “O valor correto, R$ 221 milhões, está no quadro despesas com recursos do Fundeb – RREO”, pontua. “Já os R$ 152 milhões refere-se ao cálculo da aplicação obrigatória de no mínimo 70% do Fundeb na remuneração dos profissionais da Educação, conforme determina a Constituição Federal. Neste caso, o valor aplicado foi no total de R$ 186 milhões, atendendo a legislação”, concluiu o ofício.

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