O Estado do Rio de Janeiro vai ganhar novas salas de Depoimento Especial para acolher crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual e outras violências, inclusive praticadas por familiares. A experiência bem sucedida das salas instaladas na Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV), no Centro do Rio, e na 25ª Delegacia de Polícia Civil (Engenho Novo), na Zona Norte, foi apresentada em audiência pública no plenário da Alerj, nesta quarta-feira (dia 26) e conquistou o apoio da Comissão de Assuntos da Criança, do Adolescente e da Pessoa Idosa da Casa.
“Isso é muito importante para que elas se sintam acolhidas na hora de prestar depoimento. Ninguém gosta de ir numa delegacia”, disse o deputado Munir Neto (PSD), presidente do colegiado. “Nós precisamos expandir essas salas para todo o Estado, inclusive para o Sul Fluminense. Criança e adolescente não podem ter limite geográfico”. Segundo ele, muitas violências ocorrem dentro de casa, incluindo castigos físicos que alguns pais aplicam nos filhos e também o abuso sexual, essa violência tão trágica.
A apresentação da sala de Depoimento Especial foi feita pela inspetora de Polícia Civil Rafaela Silva, da DCAV. Segundo ela, o espaço recebeu mobiliário, equipamentos, recursos audiovisuais e lúdicos para oferecer conforto, privacidade e segurança às crianças e adolescentes, ao ter que contar sobre as agressões e abusos que sofreram.
As salas de Depoimento Especial atendem à Lei da Escuta Protegida (Lei 13.4231/2017), que estabelece tratamento diferenciado a crianças e adolescentes. Durante a audiência pública, também foi discutida a oferta de cursos de formação e capacitação de agentes públicos para atuarem no combate ao abuso sexual infantojuvenil e o fortalecimento dos conselhos tutelares, além de professores e profissionais da rede pública de ensino.
Violência familiar – ‘Não Bata, Eduque’
A audiência pública marcou o Dia Nacional pela Educação Sem Violência (26/6) e também os 10 anos da Lei do Menino Bernardo (13.010/2014), que complementa o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), garantindo o direito de serem educados e cuidados sem castigos físicos e humilhações.
Ana Paula Rodrigues, articuladora da rede ‘Não Bata, Eduque’, disse que foram mais de 180 mil denúncias em 2023, o que representa mais de 500 por dia, somente pelo Disque 100, do Ministério dos Direitos Humanos. “Infelizmente, as mães aparecem como principais suspeitas na maior parte dos casos porque estão mais sobrecarregadas. É preciso cuidar de quem cuida”, disse. Ana Paula aproveitou para convidar os presentes a aderirem à campanha dos 16 dias de ativismo, iniciados nesta quarta e que vão até o dia 11 de julho.
“É com a união de sociedade, estado e a família que a gente vai cumprir essa promessa feita para nossas crianças e adolescentes lá em 1988, na Constituição”, disse Rodrigo Azambuja, coordenador da Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado do Rio.
“Lugar de criança é no orçamento público”, disse a pediatra Rachel Sanchez, do Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), cobrando que as políticas públicas, de fato, saiam do papel e entrem no OCA (Orçamento da Criança e Adolescente), previsto em lei estadual. “Enquanto não diminuir a desigualdade social, de gênero, de raça, etnia, vamos enxugar gelo e apagar incêndio à custa de trabalho insano das ONGs”, pontuou.
Mães e avós de crianças e adolescentes relataram situações de violência e abusos. Luciane Vieira, mãe atípica de Theo, um adolescente de 12 anos, diagnosticado dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA), relatou que o filho sofreu bullying e outras violências por parte de professoras e colegas em duas escolas. “É duro ouvir que seu filho é excluído”, contou Luciane. Hoje, Theo está bem adaptado em outra escola e até se tornou representante de turma.