“O racismo deixou marcas no meu filho”: Mãe relata sofrimento após episódio em escola particular de Volta Redonda

“Ele chegou em casa quieto, com o olhar triste, e só depois de muita insistência contou que foi chamado de ‘macaco’ pelos colegas. Ele só tem 7 anos. Desde então, tem resistência em ir para a escola”, relata, com a voz embargada, a mãe de um aluno de uma escola particular de Volta Redonda.

O caso de racismo, registrado pela família em boletim de ocorrência feito na 93ª Delegacia de Polícia, aconteceu no início do ano passado. Mais de um ano depois, mesmo mudando de colégio e apesar da tentativa de seguir em frente, as marcas emocionais seguem vivas. “Não é só sobre o que falaram, é sobre como isso mudou o jeito dele de ver o mundo”, afirma a mãe.

Enquanto essa família tenta cicatrizar a dor deixada por um ato cruel de preconceito, um caso recente reacende o debate sobre o racismo no ambiente escolar da cidade. A Polícia Civil e a Secretaria de Estado de Educação (SEE) investigam denúncias contra uma professora do Instituto de Educação Manuel Marinho, na Vila Santa Cecília. Alunos relataram que a docente teria afirmado em sala de aula que “a escravidão nunca existiu”, que “negros se vitimizam muito” e, de forma ainda mais chocante, elogiado Adolf Hitler, líder do nazismo.

Diante da repercussão, a professora foi afastada de suas funções. A SEE confirmou a abertura de uma sindicância e enviou uma equipe do Núcleo de Diversidade Racial à unidade para prestar apoio à comunidade escolar. O Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe) também repudiou veementemente as falas da docente e formalizou uma denúncia ao Ministério Público.

A gravidade do episódio se soma a um cenário preocupante. Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) do Rio de Janeiro revelam um crescimento expressivo nas denúncias de preconceito por raça, cor, etnia e religião em Volta Redonda: foram oito casos registrados apenas em 2024, contra três em todo o ano de 2023 e apenas um em 2022.

Alerj quer criar protocolo antirracista em escolas do estado

Diante dessa escalada de violência simbólica, a Comissão do Cumpra-se, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), realizou nesta semana uma audiência pública para discutir sugestões ao Projeto de Lei 1529/2023. A proposta visa criar procedimentos específicos para coibir o racismo e a intolerância religiosa em escolas públicas e privadas fluminenses. A reunião aconteceu na sede do Parlamento, com participação de representantes da sociedade civil, da educação e do poder público.

“Estamos empenhados em combater práticas criminosas e nefastas dentro de escolas, misturando racismo e intolerância religiosa, que vêm atingindo o bem-estar psicológico de vários alunos. Nos últimos tempos, essa cultura de ódio tem se agravado, já tendo sido registrados inúmeros casos de alunos e alunas atingidos, inclusive alguns fatais, como o suicídio de um adolescente do ensino médio de um colégio em Maricá”, declarou o presidente da Comissão, deputado Carlos Minc (PSB).

Vale lembrar que, conforme a Constituição Federal, o racismo é crime inafiançável e imprescritível, previsto na Lei 7.716/1989. Isso significa que quem comete esse tipo de violência pode ser condenado, mesmo que anos se passem desde o ato.

Enquanto políticas públicas tentam responder a essa realidade, mães como a de Volta Redonda seguem tentando reconstruir a confiança e a autoestima dos filhos. “A gente tenta esquecer, tenta ensinar o perdão, mas a verdade é que meu filho nunca mais foi o mesmo desde aquele dia”, finaliza.

Pesquisa

Uma pesquisa apoiada pelo Ministério da Igualdade Racial e divulgada nesta semana revelou um dado alarmante: 84% das pessoas pretas no Brasil afirmam já ter sofrido discriminação racial. O estudo avaliou situações cotidianas de preconceito, como tratamento com menos respeito, atendimento pior em lojas e restaurantes e até perseguições em estabelecimentos comerciais. As mulheres pretas são as mais afetadas – 72% relataram sofrer mais de um tipo de discriminação.

Imagem ilustrativa

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.