Na Praça Pandiá Calógeras, no bairro Sessenta, a água chegou antes da fita inaugural. Não foi um temporal de verão, desses que arrancam tampas de bueiro e fazem sumir sacolas plásticas na enxurrada. Bastou uma chuva branda, em pleno inverno, para que a pista de skate, 4.627 metros quadrados de concreto especificados com rigor técnico em memorial descritivo, virasse um mosaico de espelhos d’água.
Do portão, um morador, segurava o celular e filmava tudo. “Que decepção das crianças. Não tem escoamento nem dreno. Choveu um pouquinho só”, disse, enquanto dois vizinhos empurravam a água com rodos, numa coreografia tão repetitiva quanto inútil. Minutos depois, o vídeo já estava nas redes sociais. Um terceiro morador, mais direto, resumiu a frustração: “Nem inaugurou. Muita incompetência.”
No papel, a história era outra. O Grupo VR Comércio e Serviço, empresa contratada para a obra, prometeu caixas de ralo em alvenaria, grelhas de ferro fundido, nivelamento a laser e polimento de concreto. Cada obstáculo da pista deveria obedecer a ângulos milimétricos. As juntas de dilatação, cortadas na hora exata, seriam preenchidas com silicone. Tudo conforme o projeto. Na prática, o concreto virou piscina.
Engenharia do aditivo
A revitalização da Praça Pandiá Calógeras começou em fevereiro de 2024 e já custou R$ 4,9 milhões, quase o dobro da previsão inicial de R$ 2,6 milhões. Oficialmente, a prefeitura de Volta Redonda nega qualquer superfaturamento. Chama de “fracionamento de licitações”.
Na prática, foram cinco contratos: R$ 3,2 milhões (após aditivos) para o Grupo VR; R$ 616 mil para a reforma da alameda com a AD Soluções e Serviços; R$ 413 mil para o mobiliário urbano com a MMCITE BR; R$ 77,9 mil para um novo quiosque da Construlak Engenharia; e R$ 598 mil para a pavimentação asfáltica no entorno.
Um servidor do município ouvido pela Folha do Aço, sob anonimato, definiu assim: “É tipo picar a conta no cartão para não estourar o limite. Só que aqui a fatura é paga com dinheiro público.”
Promessas que escorrem
Com 25 mil metros quadrados, a Pandiá Calógeras não é apenas uma praça: é um projeto de marketing urbano. Nova pavimentação, pista de caminhada, iluminação moderna, quadra de basquete, duas de futevôlei, campo de futebol society, quadra de tênis e até ipês-rosa e amarelos para compor a paisagem.
A inauguração estava prevista para agosto de 2024. Não houve comunicado oficial de adiamento. Apenas aditivos, aditivos e mais silêncio. Enquanto isso, a pista de skate, antes mesmo de estrear, já virou prova de que a obra tem problemas de drenagem.
Não é a primeira vez que o prefeito Neto (PP) corta uma fita na Pandiá Calógeras. Em 2014, a praça passou por uma reforma que custou R$ 2,3 milhões e só foi entregue dois anos depois do previsto. Agora, uma década depois, a história se repete com orçamento maior.
No memorial descritivo, há uma promessa curiosa: “A obra será considerada concluída quando todos os serviços estiverem acabados, estando o local completamente limpo e livre de entulhos e em condições de receber a vistoria final.” Nenhuma dessas vistorias, porém, fala de moradores com rodos tentando drenar água antes da inauguração.
Enquanto ipês e quadras esportivas seguem no papel, as poças já estão inauguradas.