“Eu nunca imaginei que algo assim pudesse acontecer comigo. Recebi uma mensagem de alguém se passando pela minha advogada, dizendo que havia uma conclusão no meu processo e que eu precisava pagar imediatamente as custas para resgatar o valor. A pessoa falava com segurança e usava termos jurídicos, então confiei. Acabei transferindo dinheiro achando que fazia a coisa certa. Só depois desconfiei, liguei para o escritório e percebi que havia caído em uma fraude. Me senti enganada, impotente e envergonhada”.
O relato é de uma moradora de Volta Redonda que perdeu R$ 3 mil no chamado Golpe do Falso Advogado, que tem feito vítimas por todo o país. Na fraude, falsos advogados obtêm dados de processos por fontes públicas ou invasão de sistemas judiciais e entram em contato com as vítimas solicitando transferências de valores. Segundo a OAB-VR, já são 63 comunicações de registros de ocorrência relacionados a esse crime na cidade.
A vice-presidente da OAB-VR, Annelise Dias, alerta que o problema se agravou.
“Desde o início da gestão, estamos atentos ao aumento e à diversificação das fraudes. A OAB já emitiu ofícios em 2024 e 2025 orientando a advocacia. Também criamos uma comissão interna para acompanhar os registros e solicitamos celeridade nas investigações”, disse Annelise, reforçando que os advogados devem alertar clientes e ex-clientes, deixando claro em contrato quais são os canais oficiais de contato. “Já há indícios de uso de inteligência artificial para clonar vozes. Por isso, divulgamos o modus operandi dos golpistas em rádios, jornais, redes sociais e outdoors”, acrescentou.
Segundo a 93ª Delegacia de Polícia, cerca de 160 ocorrências desse tipo de crime foram registradas desde 2023 em Volta Redonda. A maioria corresponde a tentativas frustradas, mas houve prejuízos confirmados, como os R$ 3 mil da vítima citada no início da reportagem e os R$ 2.500 de outro caso divulgado anteriormente pela Folha do Aço.
Recentemente, advogadas de Volta Redonda também relataram ter seus nomes usados como “iscas” pelos criminosos. Roberta Raposo, especialista em Direito Previdenciário, disse já ter sido alvo de falsários em pelo menos cinco ocasiões e passou a incluir cláusulas de alerta nos contratos. Alessandra Gonçalves emite comunicados em redes sociais e grupos de advogados, enquanto Danielle Pinheiro envia mensagens a clientes reforçando que nenhuma cobrança é feita fora do escritório.
Operação nacional
O problema não se restringe à região. Nesta semana, uma operação policial em seis estados (SP, RJ, CE, PE, BA e RN) prendeu 11 pessoas acusadas de integrar uma organização criminosa responsável por invadir sistemas do governo federal e de tribunais de justiça para aplicar a fraude. Ao todo, foram expedidos 66 mandados de busca, apreensão, prisão e bloqueio de contas.
OAB-RJ intensifica combate
Na posse da nova Comissão Especial de Combate ao Golpe do Falso Advogado, presidida por Luciana Pires, a OAB-RJ lançou uma cartilha de orientação para que os profissionais compartilhem com clientes. A presidente da seccional, Ana Tereza Basílio, destacou o trabalho integrado com a Corregedoria, Ministério Público, Tribunal de Justiça e Polícia Civil. O objetivo é centralizar as investigações e reforçar a resposta institucional para que os crimes não fiquem impunes.
Polícia Civil alerta: como não cair na fraude
O delegado titular da 93ª DP, Vinícius Coutinho, explica que o avanço das fraudes está ligado à facilidade das transações digitais. “Com dados de processos obtidos em fontes públicas, os golpistas entram em contato se passando por advogados e pedem depósitos com a justificativa de custas judiciais. Só depois da transferência a vítima percebe a fraude”, disse.
Ele orienta:
– Nunca transfira valores sem confirmar diretamente com seu advogado;
– Desconfie do senso de urgência (processos que duram anos podem esperar);
– Acione o banco o quanto antes e utilize o Mecanismo Especial de Devolução (MED) do Banco Central;
– Registre boletim de ocorrência e comunique à OAB, que já firmou parceria com a Polícia Civil para acelerar as investigações.
A recomendação final, tanto da OAB quanto da polícia, é clara: desconfie de contatos não oficiais e jamais envie dados ou dinheiro sem ter certeza absoluta da origem da solicitação.