A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), realizou audiência pública nesta terça-feira (18/03) para discutir o aumento de casos de feminicídio no Estado. Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) apresentados ao colegiado, é registrado um crime a cada 72 horas contra as mulheres, além disso o Rio ocupa o quinto lugar no ranking global de feminicídio, de acordo com dados do Ministério Público.
A audiência contou com a participação de lideranças de instituições sociais e representantes de órgãos governamentais, que debateram estratégias e políticas públicas para combater essa violência crescente. A partir do debate, a presidente do colegiado, deputada Renata Souza (Psol), anunciou que propôs Indicação Legislativa para criação de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) em municípios que ainda não contam com esse serviço.
Durante os debates, foram apresentados diversos dados que salientam o expressivo aumento de casos desse tipo de crime contra a mulher. Ainda segundo levantamento do ISP, 84% dos assassinatos ocorreram dentro das residências das vítimas e em 22% dos casos os filhos presenciaram a morte da mãe.
Renata Souza destacou a gravidade da situação dos feminicídios no Rio de Janeiro, onde, a cada 72 horas, uma mulher perde a vida de forma brutal. “Isso é gravíssimo e demonstra o quanto estamos falhando enquanto Estado e também como democracia”, afirmou. Ela também mencionou a importância da criação de políticas públicas voltadas para as mulheres. “Nós fizemos indicações legislativas para a abertura de DEAMs em cidades onde não há Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher, o que é fundamental, para que as vítimas recebam um atendimento adequado e possam se sentir seguras e acolhidas”, disse.
A deputada Dani Balbi (PCdoB), também presente na audiência, disse que há uma insuficiência do orçamento do Estado destinado às políticas públicas para as mulheres, que representa menos de 0,5% do recurso. Ela enfatizou a necessidade urgente de reforçar essas políticas, especialmente em áreas como segurança, educação e saúde, para combater as várias formas de opressão que as mulheres enfrentam. Balbi pontuou ainda a importância do trabalho conjunto entre as deputadas da Casa para ampliar os direitos femininos. “Precisamos nos organizar para que todas as deputadas, nas suas áreas de atuação, contribuam para a ampliação dos direitos das mulheres”, afirmou.
Cenário alarmante
A socióloga Munah Malek, representante do Levante Feminista contra o Feminicídio, afirmou que a violência contra as mulheres no Brasil atinge proporções alarmantes, comparáveis a um cenário de guerra. “Pelo menos 1.400 mulheres são mortas por ano no país – 14 mil em uma década – e cerca de 21,4 milhões de violências são cometidas contra seus corpos, afetando, em sua maioria, mulheres negras. A violência ocorre em todas as idades, especialmente no ambiente doméstico, e tem se tornado mais cruel contra mulheres jovens. Não se indignar é pactuar com essa violação dos direitos humanos”, pontuou.
Graciele Silva, representante do Movimento de Mulheres de São Gonçalo, foi vítima de uma tentativa de feminicídio em outubro de 2024 e trouxe para a audiência o seu relato. O agressor já tinha 34 passagens pela delegacia, sendo 16 contra mulheres – todas com medidas protetivas. Graciele foi atacada dentro de um consultório de odontologia, durante uma consulta, quando o criminoso invadiu o local e proferiu 15 facadas contra ela. “Eu sou a 17ª vítima do meu agressor e poderia ter sido uma das vítimas fatais de feminicídio, aumentando ainda mais as estatísticas. Gostaria de pedir, encarecidamente, que o Estado priorize políticas públicas para combater esse crime “, relatou.
Rede Mulher
Diante deste cenário, Ana Luísa Azevedo, representante da Secretaria de Estado da Mulher, apresentou algumas ações da pasta. Entre elas está o aplicativo “Rede Mulher”, que facilita denúncias e pedidos de socorro, oferecendo uma via de comunicação entre as vítimas e as forças de segurança. “Temos anotado uma série de ações para prevenir o feminicídio e garantir a proteção das mulheres em situação de risco. Nossa prioridade é fortalecer a rede de atendimento, garantindo que todas tenham acesso à suporte, segurança e apoio”, pontuou.
Representando a patrulha Maria da Penha, a tenente Eduarda Iozzi falou sobre a importância da atuação e preparo da força de segurança: “Nós temos um curso específico para atendimento de violência doméstica. Geralmente, o primeiro contato dessa vítima é com a gente, então precisamos de um policial treinado e que entenda a importância dessa discussão”.
Ainda durante a audiência, a representante do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, Eyleen Oliveira, ressaltou a importância da atuação da instituição no combate à violência contra a mulher, mas enfatizou que apenas a aplicação da lei não basta. “Nosso papel é garantir o devido processo legal, com apoio e investigação, mas isso não é suficiente. Precisamos entender onde atuar com mais eficácia. O Ministério Público tem o dever de fiscalizar o orçamento e as políticas públicas, e nós estamos comprometidos em fortalecer essa rede de proteção”, disse.
Também participaram da audiência Tula Corrêa, representante da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (COEM); Cristiane Brandão, do Observatório do Feminicídio da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Thais Lima, da Defensoria Pública do Rio de Janeiro; e Camila Marins, jornalista e editora da Revista Brejeiras.
Foto: Alex Ramos