Na última segunda-feira (dia 6), a Justiça tomou a decisão de afastar o presidente do Lar dos Velhinhos de Volta Redonda, José João Sales. Esta ação expôs sérias acusações de maus-tratos sofridos por residentes da Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI), localizada no bairro Monte Castelo.

Testemunhas ouvidas pela 3ª Promotoria de Tutela Coletiva de Volta Redonda apontaram condições insalubres e a falta de insumos na Instituição. Todos os ouvidos foram taxativos ao afirmar que os abrigados no Lar dos Velhinhos estão em situação de risco, com a saúde e a integridade física violadas. Atualmente existem 68 idosos abrigados na unidade.

“É um abatedouro. Os idosos chegam lá para morrer”, relatou uma ex-funcionária. “Em 11 anos de trabalho, só vi a médica na Instituição duas vezes”, disse uma técnica de enfermagem ouvida pelo MP. “Os idosos ficavam ‘vegetando’ até morrer, sem serem levados para o hospital”, pontuou uma testemunha.

As informações relatadas foram validadas pelas equipes da Promotoria de Investigação Penal de Volta Redonda e do Grupo de Apoio aos Promotores (GAP/MPRJ). Isso ocorreu após a execução de um mandado de busca e apreensão no Lar dos Velhinhos, que aconteceu no último dia 31 de outubro.

O presidente da instituição, José João Salles, foi afastado por decisão judicial, acatando uma Ação Civil Pública ajuizada pelo MPRJ. “Os idosos institucionalizados na Instituição de Longa Permanência para Idosos Lar dos Velhinhos de Volta Redonda são submetidos a situações humilhantes e degradantes, tendo seus direitos básicos desrespeitados por quem deveria tratá-los com dignidade e respeito”, consta na denúncia formulada pelo promotor de Justiça Leonardo Kataoka.

“Não se pode admitir, jamais, que os idosos sejam encontrados em situações de total desassistência, como identificado nas fotos colacionadas, que deixam nítida e evidente a negligência e maus tratos praticados contra os mesmos”, conclui o MP.

Denúncia revela que idosos não têm acesso a itens básicos de higiene

A Ação Civil Pública, instaurada pelo Ministério Público, indica que o Lar dos Velhinhos de Volta Redonda não fornece sequer os cuidados básicos de higiene bucal para seus usuários. Segundo depoimentos, os idosos não têm acesso a escovas de dentes e pasta dental, elementos fundamentais para a manutenção da higiene pessoal.

“Repise-se, os dentes dos idosos não são escovados, sendo certo que praticamente todas as testemunhas ouvidas confirmaram tal absurda situação”, detalha a denúncia.

Em seu depoimento ao promotor de Justiça, Leonardo Kataoka, uma funcionária do departamento de lavanderia da Instituição relatou o vazamento antecipado das datas de fiscalização. Devido a isso, a direção mobilizava uma força-tarefa para higienizar e organizar o local, a fim de mascarar as irregularidades existentes. Contudo, o servidor do MPRJ que supostamente fornecia essas informações, ainda não foi identificado.

“Eu choro quando vejo maldade que fazem com eles. Tem hora que pedem água, porque eles não dão. Eles colocam as mesmas roupas em vários idosos, é tudo coletivo. Os idosos ficam em fila para tomar banho, sem nenhuma privacidade. Uma senhora vai lá e entrega que o pessoal daqui [do MP] que vai ter visita. Aí é feito um ‘cala a boca’, que é uma ‘maquiagem’ para disfarçar. O que acontece mesmo, ninguém vê, só a gente que tá lá dentro”, contou a mulher no depoimento.

As informações prévias recebidas pela direção do Lar dos Velhinhos, segundo o MP, atrapalharam algumas inspeções executadas no local. “Foram realizadas diversas diligências que apontaram no sentido de que um servidor público do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro estaria revelando ao presidente José João Salles e à responsável técnica Rachel Tavares de Souza a data das fiscalizações agendadas por este órgão, obstruindo, portanto, a identificação de todas as irregularidades na Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI) pelo Ministério Público”, observa a Promotoria.

A Lei Estadual 8.049/2018, que regulamenta o funcionamento de instituições de longa permanência de idosos, estabelece a qualificação e número de profissionais necessários, mas o Lar dos Velhinhos não atende a essas exigências, segundo a ACP. Com um quadro de recursos humanos aquém do necessário, o atendimento aos idosos fica comprometido, violando o artigo 50 do Estatuto do Idoso.

“O quadro de recursos humanos da instituição está aquém do quantitativo necessário de profissionais, uma vez que atualmente existem 68 idosos abrigados no Lar dos Velhinhos de Volta Redonda. Com efeito, infere-se que o quadro de recursos humanos da instituição é composto por: um psicólogo, um assistente social, duas fisioterapeutas, um nutricionista, uma educadora física, dois enfermeiros, 13 técnicos de enfermagem (uma afastada) e 11 cuidadores”, detalha a denúncia.

No procedimento executado no dia 31 de outubro, representantes do Ministério Público confiscaram receitas de medicamentos controlados, assinadas, mas não preenchidas. Essas apreensões corroboram as alegações feitas pelos funcionários da instituição, afirmando que a médica responsável raramente é vista no local.

“É certo que os medicamentos são de fato prescritos pela enfermeira responsável. E também foram apreendidos, no interior do Lar dos Velhinhos de Volta Redonda, receituários médicos assinados por outro médico, sem a identificação e qualificação do idoso/paciente, apenas indicando a medicação, o que confirma o fato de que os idosos não recebem atendimento médico adequado e que a enfermeira é quem, na prática, ‘prescreve’ medicações para os idosos”, contextualiza o MP. “O Lar dos Velhinhos de Volta Redonda não assegura a assistência integral aos idosos ali abrigados e não garante os direitos constitucionalmente consagrados”, conclui.

 Vice-presidente assume por 90 dias

Com o afastamento do presidente José João Sales, o Lar dos Velhinhos será dirigido pelo vice-presidente, Otávio Luiz Gama, pelo prazo de 90 dias. A decisão de Justiça também determinou ao Comissariado de Justiça que realize fiscalização na Instituição que funciona no bairro Monte Castelo, quinzenalmente.  

  A Ação Civil Púbica ressalta ainda que o dirigente da instituição, agora afastado, desde que assumira a gestão, vinha recebendo orientações de representantes do Ministério Público e do Departamento de Vigilância Sanitária de Volta Redonda, além de concessão de prazos e prorrogações para a sua integral regularização, sem sucesso. E que inspeção realizada pela equipe técnica no estabelecimento, em 10 de outubro deste ano, foi verificado que José Sales continuava descumprindo as normas relativas ao adequado atendimento asilar, conforme determinam a Lei Estadual 8049/2018, a Lei Federal 10.741/2003 e a Resolução de Diretoria Colegiada 502/2021, do Ministério da Saúde/Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Ficou constatado, nesta visita recente, que a instituição não garante equipe mínima para proporcionar os cuidados de saúde necessários aos idosos; não atualiza o plano de atendimento individualizado dos idosos, por meio de sua equipe técnica, o que impede a construção de atividades que produzam maior autonomia dos idosos; conta com espaço físico inadequado, tendo sido identificadas vidraças das janelas e das portas dos quartos quebrados, bem como campainhas com defeito; entre outras deficiências.

A Folha do Aço tentou contato com o presidente afastado do Lar dos Velhinhos de Volta Redonda, José João Sales,, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.

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