“Por muito tempo, eu nem percebia que estava sendo violentada. Não havia gritos, nem tapas, mas as palavras dele eram como facas invisíveis. O controle era disfarçado de ‘cuidado’. Ele dizia que só queria o meu bem, mas me isolava de amigos e da família, controlava com quem eu falava, questionava tudo que eu fazia. Minhas opiniões já não importavam, meus sonhos pareciam infantis, e até meu modo de me vestir era motivo de crítica. Desenvolvi ansiedade, não dormia direito e chorava sozinha, escondida. Foi só quando uma amiga insistiu para que eu buscasse ajuda que comecei a enxergar o que estava acontecendo. Aos poucos, estou reconstruindo minha autoestima e reaprendendo a confiar em mim mesma. Ainda é um processo, mas reconhecer que fui vítima de violência psicológica foi o primeiro passo para me libertar”.

O depoimento é de uma mulher de 39 anos, moradora de Volta Redonda e uma das 725 vítimas de violência psicológica registradas na cidade em 2023. O número representa um aumento em relação aos 671 casos de 2022. Segundo o Dossiê Mulher, divulgado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), Volta Redonda também registrou, no ano passado, 591 casos de violência física, 549 de violência moral, 118 de violência patrimonial e 106 casos de violência sexual, todos com mulheres como vítimas.

De janeiro a outubro deste ano, houve 71 casos de difamação contra mulheres, mais que o dobro dos 30 registros no mesmo período de 2023. Casos de violação de domicílio também aumentaram: de 27 para 45 ocorrências. O número de assédios sexuais subiu de dois para 16. Constrangimento ilegal não teve casos no ano passado, e neste ano foram registradas quatro ocorrências em Volta Redonda. A tentativa de feminicídio aumentou em dois casos, passando de cinco para sete. Em compensação, o número de feminicídios diminuiu de 1 para zero.

Somente em 2023, mais de 72 mil pessoas foram vítimas de violência psicológica em todo o estado, sendo 51.019 mulheres (70,2% do total das vítimas). A violência psicológica é uma forma de abuso que visa controlar, dominar e exercer poder sobre as mulheres mediante humilhação pública ou privada, manipulação emocional, ameaças e outros comportamentos coercitivos. Ela se manifesta a partir de diferentes tipos de condutas, como o controle das vestimentas, críticas ao corpo, questionamento sobre a saúde mental da vítima e sua capacidade de gerenciar a própria vida ou isolá-la do mundo, impedindo-a de trabalhar, estudar ou desenvolver atividades rotineiras.

“As mulheres conscientes denunciam”, afirma delegada

A delegada da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher de Volta Redonda (Deam-VR), Juliana Montes, esclarece que a violência psicológica é um crime grave que pode causar sérios danos à saúde mental da mulher, impactando sua vida pessoal, social e até profissional.

“As mulheres conscientes denunciam, e ao denunciar, fazem justiça a medidas protetivas de afastamento e proibição de contato, a fim de cessar a causa do dano emocional”, afirmou Juliana. Ela também destacou a importância do acolhimento às vítimas, explicando que as mulheres que denunciam têm acesso a atendimento psicológico na sede da polícia e podem ser encaminhadas ao Centro Especializado de Atendimento à Mulher (Ceam) para iniciar tratamento psicológico, caso desejem.

A delegada ainda ressaltou o crescente uso das redes sociais como ferramentas para a prática de violência psicológica. “As redes sociais têm sido instrumentos muito usados para tais fins; a investigação é focada na captação de provas no ambiente virtual”, comentou. Ela reforçou que nenhuma mulher deve se submeter a relacionamentos abusivos e que, ao buscar ajuda, é possível interromper o ciclo de violência.

“Denuncie e busque ajuda. Não se submetam a tratamentos degradantes. Nenhum ser humano, homem ou mulher, merece ser humilhado, controlado ou menosprezado”, concluiu a delegada. Diversas condutas, como ameaça, injúria, difamação e calúnia, se enquadram no conceito de violência psicológica. Em 2021, foi criado o crime de Violência Psicológica no Código Penal (artigo 147-B), que prevê pena de reclusão de 6 meses a 2 anos e multa, caso a conduta não seja mais grave.

Em Volta Redonda, a rede de atendimento e amparo à mulher em situação de violência conta com a secretaria municipal de Políticas para Mulheres e Direitos Humanos e o Centro Especializado em Atendimento à Mulher. Ambos funcionam no mesmo endereço, que é a Rua Antônio Barreiros, nº 232, no bairro Nossa Senhora das Graças.

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