Apesar dos altos índices de poluição atmosférica – agravados principalmente pela produção da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) – Volta Redonda segue em direção contrária ao que se espera de uma política ambiental responsável: o corte indiscriminado de árvores urbanas. A análise é do analista ambiental do ICMBio, Sandro Leonardo Alves, que faz um duro alerta sobre a gravidade e os impactos dessa prática.
“O que está acontecendo em Volta Redonda não é poda de árvores, é assassinato de árvores”, denuncia o especialista. Segundo ele, a derrubada tem ocorrido de forma generalizada, sem embasamento técnico e, muitas vezes, atingindo exemplares saudáveis e plenamente funcionais do ponto de vista ecológico. “Volta Redonda, por ser uma cidade altamente poluída, deveria ter a arborização urbana como uma das prioridades de sua política pública. E o que a gente está vendo hoje é um corte indiscriminado e criminoso de árvores por toda a cidade. A maior parte desse corte ocorre sem nenhuma fundamentação técnica. Estamos falando de árvores que regulam o microclima, amenizam o calor, ajudam a absorver parte da poluição. Árvores que beneficiam diretamente a população”, completa.
Código Municipal de Meio Ambiente defasado
Enquanto o Brasil celebra a Semana Nacional do Meio Ambiente, o ambientalista também destaca outras fragilidades na política ambiental do município. Para ele, o aumento dos crimes ambientais nos últimos dois anos é reflexo da falência em três frentes: conscientização, fiscalização e legislação. “A conscientização ambiental ainda não alcança a maioria da população. Fica restrita a pequenos grupos. A fiscalização é quase inoperante, com uma Guarda Ambiental pouco efetiva, devido ao número insuficiente de agentes e sem formação técnica qualificada. E o Código Municipal de Meio Ambiente está completamente desatualizado – sem qualquer revisão desde 2008 – enquanto a legislação federal e estadual já avançou muito nesse período.”
A problemática, no entanto, não se restringe à vegetação urbana. Sandro lembra que os incêndios florestais, que se intensificam no período seco entre junho e setembro, atingem inclusive os 11% restantes de Mata Atlântica no município. “Essas queimadas não só ameaçam vidas humanas e a biodiversidade como contribuem para a piora da qualidade do ar, agravando ainda mais a já existente poluição atmosférica”, explica.
Outro ponto crítico apontado por Sandro é a poluição hídrica. Mesmo com os avanços no tratamento de esgoto, o lançamento irregular de resíduos nos corpos d’água da cidade ainda é uma realidade. “O Rio Paraíba do Sul recebe atenção especial, mas os afluentes locais sofrem com esgoto sem tratamento, assoreamento e despejo de dejetos. Falta investimento e planejamento”, afirma.
O analista vê com bons olhos a recente aprovação de um projeto na Câmara dos Deputados que atualiza as penas para crimes ambientais. Para ele, é uma resposta necessária ao avanço desses delitos. “A Constituição é clara: o meio ambiente é um bem coletivo, pertencente à sociedade brasileira. Se aumentam os crimes, é dever do Estado ajustar a legislação para proteger esse bem comum.”
Para Sandro, o problema central não está na ausência de leis, mas na falta de estrutura para garantir sua aplicação. “O Brasil já possui um dos arcabouços legais mais avançados do mundo no que diz respeito à proteção ambiental”, afirma. Ele cita leis federais como a 9.605/1998, que trata dos crimes ambientais, e o Decreto 6.514/2008, que a regulamenta, além da legislação estadual e do próprio Código Municipal de Meio Ambiente de Volta Redonda, criado pelo Decreto 4.438 de 2008 – este último, no entanto, considerado defasado. “De nada adianta uma legislação rígida se os órgãos fiscalizadores não têm estrutura para aplicá-la. Sem isso, as leis continuarão apenas no papel e os crimes ambientais seguirão impunes”, conclui.
A reportagem questionou a Prefeitura de Volta Redonda sobre o corte de árvores, as ações em prol do meio ambiente e os projetos para coibir crimes ambientais na cidade. Contudo, até o fechamento desta edição, não houve retorno.
Cidade registra aumento de crimes ambiente
Durante a Semana Nacional do Meio Ambiente, comemorada na primeira semana de junho – e que tem o Dia Mundial do Meio Ambiente celebrado no dia 5 -, os dados reforçam a urgência de ações efetivas. A cidade de Volta Redonda tem registrado variações nos indicadores de crimes ambientais nos últimos dois anos, com alguns aumentos pontuais que acendem o alerta para a importância da fiscalização e da conscientização. De acordo com registros oficiais do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP), o número de casos de poluição ambiental cresceu de 4 em 2023 para 6 em 2024, enquanto os crimes contra a flora passaram de 1 para 3 ocorrências. Já os crimes contra a fauna mantiveram estabilidade, com 5 casos registrados em cada ano.
Por outro lado, houve uma pequena redução nas sanções penais e administrativas ao meio ambiente, que passaram de 8 em 2023 para 6 no ano seguinte. O número de crimes de maus-tratos contra animais, no entanto, se manteve inalterado: 11 registros em cada ano.
Esses números reforçam uma preocupação crescente na cidade com os impactos ambientais causados principalmente por grandes empreendimentos industriais. A CSN segue no centro das discussões por conta da emissão do chamado “pó preto”, um resíduo visível que se acumula em janelas, carros e roupas estendidas nas residências vizinhas à usina. Moradores relatam problemas respiratórios e cobram soluções efetivas das autoridades.
No Estado do Rio, os dados também são preocupantes: houve aumento nas sanções penais e administrativas por crimes ambientais, que passaram de 1.027 em 2023 para 1.156 em 2024. Casos de maus-tratos contra animais subiram de 782 para 930, enquanto as ocorrências de poluição ambiental cresceram de 381 para 479. Os crimes contra a fauna aumentaram de 381 para 430 e, contra a flora, de 275 para 333. Também houve crescimento nos registros de pichações e outros crimes contra o ordenamento urbano (de 115 para 126). Já a produção ou comercialização de produtos nocivos à saúde humana subiu de 20 para 24. A única queda foi observada nas infrações relacionadas a estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, que diminuíram de 173 para 144.
Houve um salto alarmante nos incêndios provocados em matas ou florestas, que passaram de 19 em 2023 para 75 em 2024. Diante desse cenário, ganha relevância a aprovação recente na Câmara dos Deputados de um projeto de lei que endurece as penas para crimes ambientais, sobretudo aqueles relacionados a incêndios em vegetação. O texto aprovado propõe punições mais severas, como a elevação da pena de reclusão de 2 a 4 anos para 3 a 6 anos, além de multa e proibição de contratar com o poder público.
A proposta ainda inclui agravantes como: quando o crime expõe a vida ou a saúde pública ao perigo, atinge unidades de conservação ou é praticado por mais de uma pessoa com fins lucrativos. Há também aumento de pena em caso de lesão corporal grave ou morte decorrente do crime ambiental.
Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam que 5,7 milhões de hectares foram consumidos pelo fogo em 2024, um aumento de 104% nos focos de incêndio. O projeto segue agora para análise no Senado.